Turma de Licenciatura Plena em Geografia EAD 2013- Uniube

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Geografia Uniube EAD 2013

domingo, 19 de fevereiro de 2012

O frágil e insuficiente modo linear de pensar: a necessidade do Pensamento Complexo

As pessoas adquiriram hábitos de pensamento, um sistema de referência e valores dos quais se tornaram prisioneiras. – Simone de Beauvoir
Joan-Miro, ConstellationOs grandes colapsos e as catástrofes mundiais que começam acirrar, sobretudo, a partir do século XX, para citar algumas: as duas grandes guerras mundiais, as crises econômicas, as disputas territoriais, os governos totalitaristas, a bomba atômica, a degradação intensa da vida animal e do meio ambiente, entre inúmeras outras barbáries, têm colocado um ponto de interrogação sobre qual o rumo do planeta e de nossas vidas.
Muitas vezes esse questionamento se faz através de um cínico “não estarei aqui mesmo quando tudo isso explodir” ou um intenso sentimento de vazio e perda de identidade: em última instância, tem levado ao niilismo em seu último grau, tal como preconizado por Nietzsche no século XIX.
As barbáries não são novidades, sempre existiram, basta passar os olhos pela história. O que chama atenção é que os grandes progressos que chegaram até o momento atual não tem dado conta de possibilitar uma vida melhor para uma ampla maioria de pessoas, e o pior, tem trazido danos irreparáveis à vida e ao planeta. E dificilmente poderíamos dizer que os colapsos do nosso tempo são mais amenos que o sangue já derramado durante as civilizações na Idade Antiga e Idade Média.
A escola de Frankfurt, sobretudo através de Adorno, Habermas e Horkheimer, com aguçados olhares críticos, nos mostra muito bem que a razão do homem não tem servido para melhorar a vida, pelo contrário, tem levado à degradação da vida em suas múltiplas faces; levando a civilização do progresso e da técnica, com sua razão instrumental, voltada principalmente para o lucro, à barbárie.
Não pretendo entrar em mais detalhes sobre esses pensadores para as proporções deste texto, mas é uma vasta e complexa área para quem tiver interesse em compreensões críticas sobre a sociedade, a cultura, a mídia (indústria cultural), a educação, a ciência, a arte… enfim, a diversidade de temas que esses pensadores compreendem não se esgota aqui.
Pretendo apresentar como o nosso modo de pensar que remonta desde Sócrates, Platão, sistematizado então por Aristóteles e ganhando acabamentos na modernidade através de Descartes e depois Bacon, é insuficiente na tentativa de compreender o mundo.
Certamente que muitos não têm consciência das considerações teóricas que estão por trás dos seus modos de compreensão da “realidade” – o método pelo qual pensam -, mas o pensamento está muito bem cristalizado por um método de pensar que vingou desde Sócrates: o pensamento linear-causal; que na modernidade se encorpa através do método lógico-formal e vai perpassar todas as áreas da ciência, produzindo, “logicamente”, conhecimentos unilaterais e reducionistas.
Esse modo de pensar ou admite “isso” ou “aquilo”; ou é capitalismo ou é socialismo; ou é verdade ou é mentira; ou é certo ou é errado; ou é bonito ou é feito; ou é razão ou é emoção; ou é corpo ou é mente… é a lógica do “ou/ou” que não compreende que corpo e mente são indivisíveis, que o certo pode ser errado e vice-versa. Os exemplos são inúmeros e estão nos itinerários ordinários do dia-a-dia além de se apresentar também no palco científico que só recentemente vai começar a questionar-se.
O conhecimento científico possibilitou o avanço da técnica, e muitos ainda acham que o progresso é uma linha contínua que está sempre em evolução. Porém, todo esse “progresso” se mostra incapaz de resolver problemas como a violência, a exclusão e a miséria. Tal progresso possibilitou a produção de alimentos que seria capaz de alimentar todos os seres humanos, mas tampouco isso é uma realidade, pois muitos morrem de fome e desnutrição a cada hora.
Para a nossa cultura atual, é favorável aquele conhecimento que produz resultados materiais, em outras palavras, quanto mais lucrativo for o conhecimento ele é etiquetado como sendo o melhor, e em nome do capital o pensar não produz questionamentos pois ele já vem embalado e entrega o pensado. Trata-se de uma visão ingênua e unilateral da vida, pautada na divisão entre subjetividade e objetividade; conhecimentos humanos – que cada vez mais as pessoas desprezam – e conhecimentos exatos ou técnicos, colocados cada vez mais nas vitrines da educação mercadológica.

Um modo de pensar mais abrangente, que dê conta mais consistentemente das múltiplas forças e fenômenos que estão presentes num dado momento em um dado fenômeno, urge como uma necessidade fundamental para tentarmos fazer com que o progresso, a técnica, e o desenvolvimento racional, sejam favoráveis à Vida em sua totalidade; contudo, sem incorrer em totalitarismos, deslumbres ingênuos, messianismos, fanatismos, tribalismos, fundamentalismos ou utopismos.
A questão não é quem está certo e quem está errado, não é um jogo de nós contra eles. O certo e o errado só as conseqüências nos dirá, a história nos dirá. E parece que ela tem nos dito até agora que estamos errados. No entanto, a questão não é etiquetar as nossas ações como ou isso ou aquilo, é necessário saber que todos nós podemos estar certos e errados ao mesmo tempo. É necessário abrir mão do pesado fardo de valor que os homens têm usado, muitas vezes em nome dos seus fundamentalismos, para fixar essências imutáveis nas coisas.
Quem ainda duvidar de que precisamos urgentemente de começar a pensar sobre o nosso próprio pensamento, sobre a forma como olhamos e entendemos o mundo, duvidar da nossa própria capacidade de conhecimento, basta olhar a história recente e ver um filme do horror que jorra sangue e faz vidas voarem pelos ares; crueldades e barbáries cometidas em nome disso ou daquilo: em nome do patriotismo; em nome da ciência; em nome de Deus; em nome da honra; em nome do Bem; em nome do comunismo; em nome do capitalismo, etc.
Nesse sentido, pretendo apresentar um pouco do pensamento complexo, como tentativa de unir as duas principais formas de pensamento: o pensamento linear-causal e o pensamento sistêmico. Um pensamento que nos fornece subsídios para jogar luz ao fenômeno sob o máximo de ângulos que se conseguir.
O pensamento complexo não se vê como dono da verdade, ele não etiqueta o mundo em verdades e mentiras, pois todo conhecimento é parcial e a realidade em sua totalidade é inatingível; e se compreendo dado fenômeno é uma compreensão que se sabe mutável no tempo e no espaço, pois nenhum fenômeno permanece imutável: se olho para a economia hoje compreendo muitos aspectos, mas se olho tempos depois o conhecimento anterior poderá valer somente em alguns pontos, ou poderá ser totalmente descartável; diz-se que a economia está e não é “assim”. O complexo como norte do pensamento compreende que nós somos a nossa única salvação, e para tal, é necessário (re)pensar a nossa forma de pensar e de lançar olhares sobre o mundo.
Não pretendo esgotar o assunto, até porque seria impossível, mas objetivo apresentar, de maneira didática, a necessidade do pensamento complexo. Na continuação desse texto pretendo jogar um pouco de luz sobre o que é o pensamento linear-causal e o pensamento sistêmico, de modo a clarificar a tomada de consciência para o pensamento complexo.
Há muito tempo venho relutando em escrever sobre o assunto, pois percebo que um grande obstáculo se interpõe para essa tentativa: a própria linguagem; trocando as palavras, como posso apresentar um modo de pensar circular se a própria linguagem é seqüencial? – Aqui é onde a razão se quebra nela mesma!
A estrutura da nossa linguagem, assim como a língua inglesa, alemã, francesa, espanhola, etc., é originária do que se compreende como tronco indo-europeu; nesses idiomas, a forma de escrever e falar é pautada por um raciocínio seqüencial: as coisas e as idéias são postas umas após as outras, produzem análise facilmente mas dificultam a síntese, compreendem mais as partes mas ocultam o todo. Eis aqui um fantasma que me assombra todas as vezes que busco ilustrar o papel com palavras que, por mais que eu tente expressar a simultaneidade, elas só dão conta de um pensamento seqüencial – linear. Nesse sentido, Nietzsche mostra toda sua engenhosidade ao apontar-nos da necessidade de (re)inventar a linguagem, desautorizá-la do seu aspecto “pegajoso” sobre as coisas, que marca identidades fixas e imutáveis no tempo. Ele vai mais além, e nos diz que todo conhecimento está enredado pela metafísica das palavras, de tal forma que a história do conhecimento é a história da repetição em palavras diferentes. Ciente de que me empolguei um pouco com os propósitos deste texto, deixo como indicação para o leitor interessado no assunto, o interessantíssimo livro de Viviane Mosé, Nietzsche e a grande política linguagem. Por ora, faz-se necessário que eu aceite o desafio desse obstáculo que se apresenta como o grande monstro a ser vencido quando me deparo com a fala e a escrita.
Gostaria muito de levar o pensamento do leitor a um colapso, mas tal pretensão está longe dos meus dotes com as palavras. Mas se o mesmo conseguir, minimamente, compreender que é possível ter várias perspectivas de tomada de conhecimento sobre o mundo ao mesmo tempo, sem torná-las excludentes, e sem vislumbrar o estandarte do verdadeiro, e que talvez estejamos já há um bom tempo sonhando que estamos vivendo a era do progresso correndo o risco de acordar no inferno, creio eu, já ser resultados positivos para essa proposta. – Talvez possamos acordar a tempo de apagar o fogo!

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